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Consequências da Insolvência

A insolvência é uma situação jurídica que ocorre quando uma pessoa, singular ou coletiva, se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações financeiras, com os passivos a superarem os ativos disponíveis.

A legislação aplicável a esta situação, está regulada pelo Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), pelo Código de Processo Civil (CPC) e, em alguns casos, pelo Código Penal (CP), dependendo das circunstâncias em que se encontra o devedor e das responsabilidades associadas à gestão dos ativos e passivos.

A insolvência pode acontecer a indivíduos ou empresas, com consequências distintas em cada caso, mas ambas as situações podem afetar gravemente a vida financeira, a reputação e a capacidade de reestruturação futura, tanto a nível pessoal como empresarial. 

Insolvência Pessoal

Quando um indivíduo se encontra numa situação de insolvência, ele ou os seus credores podem requerer a abertura de um processo judicial com o objetivo de resolver a situação de incumprimento.

A insolvência pessoal é, muitas vezes, uma solução extrema para quem não consegue fazer face às dívidas acumuladas e visa regularizar o pagamento aos credores, geralmente através da liquidação dos bens.

Após a declaração de insolvência, o devedor vê os seus bens sujeitos ao controlo de um administrador de insolvência, cuja função é avaliar o património do insolvente, os seus passivos e os créditos a favor dos credores.

Este processo resulta na venda dos bens, de modo a satisfazer as dívidas contraídas.

Uma das principais consequências imediatas da declaração de insolvência é a suspensão de todos os processos executivos e de penhoras em curso.

Todos os credores são obrigados a submeter os seus créditos ao processo de insolvência, e o devedor fica impedido de realizar atos de administração sobre o seu património.

O CIRE, em conjunto com o CPC, rege o procedimento, e as dívidas são pagas de acordo com a ordem de preferência prevista na lei.

No entanto, nem sempre a liquidação do património cobre todas as dívidas.

Neste caso, o devedor pode pedir ao tribunal a exoneração do passivo restante, um mecanismo previsto no CIRE, que permite, após a liquidação dos bens e o cumprimento de um plano de pagamentos durante cinco anos, a extinção das dívidas que não tenham sido pagas.

Esta medida destina-se a oferecer uma segunda oportunidade ao devedor, embora implique o cumprimento rigoroso das condições impostas pelo tribunal, incluindo a entrega de uma parte dos rendimentos que o devedor possa auferir nesse período.

O regime de insolvência pessoal prevê a proteção de alguns bens essenciais, tais como objetos indispensáveis à profissão do devedor ou os bens essenciais à sua subsistência.

Embora a maior parte do património seja liquidadas para satisfazer os credores, o CIRE assegura que o devedor mantenha os bens básicos para continuar a sua vida com dignidade.

Insolvência Empresarial

A insolvência empresarial ocorre quando uma empresa não consegue cumprir as suas obrigações financeiras, como o pagamento de dívidas a fornecedores, bancos ou ao Estado.

Tal como na insolvência pessoal, também aqui pode ser o devedor ou os seus credores a requerer a abertura de um processo de insolvência.

Quando uma empresa é declarada insolvente, a sua gestão passa para as mãos de um administrador de insolvência, que tem como responsabilidade a avaliação do património da empresa, a determinação do montante dos créditos e a liquidação dos bens para satisfazer, na medida do possível, as obrigações financeiras. Os sócios e administradores da empresa perdem o controlo sobre a sua gestão, podendo a empresa ser liquidada ou sujeita a um plano de recuperação.

A liquidação implica o encerramento definitivo da empresa e a venda dos seus ativos para pagar os credores, seguindo uma ordem de prioridade legal. Neste caso, a empresa deixa de existir juridicamente após o pagamento das dívidas e a conclusão do processo judicial.

No entanto, existe a possibilidade de evitar a liquidação através do Processo Especial de Revitalização (PER), um mecanismo que permite às empresas insolventes apresentarem um plano de recuperação aos seus credores. Este plano pode incluir a reestruturação das dívidas, prazos de pagamento mais longos ou até a redução dos montantes devidos, com o objetivo de manter a empresa em funcionamento. O PER é uma solução destinada a evitar o colapso das empresas que ainda têm viabilidade económica, mas que enfrentam dificuldades financeiras temporárias.

Contudo, nem todas as empresas conseguem evitar a liquidação. Nos casos em que o tribunal ou os credores não aceitam o plano de recuperação, a empresa entra em fase de liquidação. A liquidação dos ativos é feita em conformidade com o CIRE e o CPC, com prioridade dada ao pagamento de créditos laborais, créditos fiscais e créditos garantidos.

Uma consequência grave para os gestores e sócios de empresas insolventes é a possibilidade de serem considerados responsáveis pessoalmente pelas dívidas, especialmente em situações de insolvência culposa. O CIRE prevê a possibilidade de qualificação da insolvência como culposa quando se verifica que os administradores ou sócios agiram de forma negligente ou fraudulenta, contribuindo para a situação de insolvência. Nestes casos, os sócios podem ser pessoalmente responsabilizados pelas dívidas da empresa, incluindo a perda dos seus bens pessoais.

Para além disso, os administradores envolvidos em insolvências culposas podem ser proibidos de exercer cargos de gestão em empresas durante um período determinado pelo tribunal. Esta inibição pode prejudicar a capacidade dos empresários para continuar as suas atividades comerciais no futuro, sendo uma das consequências mais severas da insolvência empresarial.

A insolvência também tem um impacto significativo na reputação empresarial. As empresas que passam por um processo de insolvência perdem a confiança dos parceiros comerciais, fornecedores e clientes. Mesmo que consigam recuperar, as empresas podem encontrar dificuldades em obter financiamento ou firmar novos contratos comerciais, o que compromete a sua viabilidade no longo prazo.

Consequências para os Credores

Os credores têm um papel central no processo de insolvência, uma vez que são os principais interessados na recuperação dos seus créditos. Contudo, a insolvência pode trazer consequências adversas para os credores, uma vez que nem sempre o património do devedor é suficiente para cobrir a totalidade das dívidas.

Os créditos são pagos de acordo com uma ordem de prioridade, estabelecida pelo CIRE. Primeiramente, são pagos os créditos garantidos, como hipotecas e penhoras. Em seguida, são pagos os créditos laborais, que incluem salários em atraso e indemnizações devidas aos trabalhadores. Só após o pagamento destes créditos preferenciais é que os restantes credores, como fornecedores e bancos, recebem os seus montantes.

Na prática, muitos credores ficam sem receber a totalidade do que lhes é devido, especialmente em casos em que o devedor não tem bens suficientes para satisfazer todas as obrigações.

Apesar de os credores poderem participar no processo de insolvência, nomeadamente através da assembleia de credores, onde têm a oportunidade de votar sobre os planos de liquidação ou recuperação, a insolvência raramente resulta no pagamento integral dos créditos. Este é um dos maiores riscos enfrentados pelos credores em situações de insolvência.

Conclusão

A insolvência, seja ela pessoal ou empresarial, traz consequências profundas para todos os intervenientes. Para os devedores, representa a perda de bens, a restrição de acesso a crédito e, em muitos casos, a perda de reputação. Para os credores, representa o risco de não conseguirem recuperar a totalidade dos créditos, sendo muitas vezes obrigados a aceitar perdas.

Contudo, a insolvência também pode ser uma oportunidade para recomeçar. Em casos de insolvência pessoal, a exoneração do passivo restante permite ao devedor reconstruir a sua vida financeira. No caso das empresas, o Processo Especial de Revitalização oferece uma segunda oportunidade para continuar a atividade económica, desde que com o apoio dos credores e sob condições que garantam a viabilidade do negócio.

A insolvência é, sem dúvida, um processo complexo e cheio de implicações, mas é também um mecanismo essencial para equilibrar os direitos e deveres de devedores e credores no ordenamento jurídico português.

Consulte dos Advogados da António Pina Moreira, Advogados no Porto e em Santo Tirso.